quinta-feira, 19 de junho de 2008

Concurso


As inscrições para o concurso Poemas nos Ônibus estão abertas e a metida aqui já levantou o dedo: "eu, eu!" É lógico que não sou nenhuma Florbela Espanca da vida, mas vale a tentativa. Inscrevi o poema que se segue. Será que vai colar?

Tráfego

Passam por mim
Os ipês da primavera que florescem no asfalto
Esquecem, por um momento,
Da cinza da fumaça
Das caras pálidas que trafegam pela rua
Do ronco ranzinza dos motores.

Eu, passageira,
Pouso meu olhar sobre os ipês
E esqueço do meu cenho cinza
Dos dias pálidos que trafegam pela minha vida
Do ronco ranzinza dos meus pensamentos.

terça-feira, 17 de junho de 2008

Versos capitulinos


(Pra quem, como eu, é fã do Machado)

Pára entre meios segundos
O tempo aluado
De um cínico machadiano qualquer
Que ri o riso irônico
De quem mostra os dentes
Sem sorrir com os olhos:

A realidade, caro leitor,
Não se encerra nas páginas de um livro.

domingo, 8 de junho de 2008

Aniversário


(Mui pretencioso auto-retrato de não sei quando)

Estou para fazer aniversário a qualquer momento. Sim, porque hoje não significa nada dizer “uma semana” ou coisa que o valha, porque o tempo desinflacionou, “hipoinflacionou”. O tempo não é quase nada hoje, um fragmentozinho, um suspiro do relógio e pronto, já passou.

E por isso mesmo que eu não comemoro o tempo no meu aniversário.

Se estou fazendo vinte e seis, ou mesmo doze, quinze, dezoito, quarenta e seis... tant pis. O que comemoro mesmo é a própria comemoração, é a festa, o dia que é meu, metacomemoração! Portanto, marquem aí: dia 14 - esse átimo - é o MEU dia, assim mesmo, bem narcísica e egolátrica como criança na fase do “meu” (beijo pro Pedro e pra Duda). Quem quiser me dar os parabéns que esqueça do tempo, porque, nesse dia, meu relógio não vai funcionar. Me dê os parabéns pelo momento todo: pelo dia não temporal e sim pela chuva que vai cair (sempre chove no meu aniversário), pelo que estarei fazendo, pelo quebra-cabeças que me compõe e por todos os et ceteras que se quer dizer. Eu sou que nem meu pai, que gosta de bolo, balão, bastante gente, presente, música, bagunça e lembrancinha. Eu sou também como o Pedro que, na sua segunda primavera, gritava pro primeiro que passasse: “Viva o Pedro!”

E quem não lembrar que não se culpe, porque não tenho a mais oblíqua envergadura moral pra cobrar...

sábado, 7 de junho de 2008

Poema no ônibus


(Foto que tirei não sei onde. Também é antiga)

Como é bom ser surpreendida pelas palavras! Tava esses dias andando de ônibus e li essa poesia, que achei fantástica:

Dias melhores verão

Desfruta
Sem pressa
Essa tua primavera
Quando o verão chegar
E fores fruto maduro
Vou te colher
Com apuro
E te comer
De colher

Germana Konrath

terça-feira, 3 de junho de 2008

Espaços vazios


(Desenho meu. Não sei de quando, só sei que é BEM antigo)

Reflexões acerca do tema da minha dissertação:

Os espaços vazios nascem hoje na selva. De pedra. Brotam no concreto e crescem com o barulho da rua, no canto de um bar qualquer.

Um bar não é um espaço vazio.

O espaço vazio é aquilo que o homem urbano e contemporâneo cria quando da sua situação híbrida de ator e espectador de si mesmo, e essa imagem é triste, porque traz um nada não absoluto. Se ele fosse absoluto, seria nada e pronto; mas um nada não absoluto é vulnerável, inconstante e perigoso. Ele sempre traz em si uma brecha por onde escapa a ansiedade.

Do nada.

Para o concreto também se volta essa ansiedade e – lá está ela – nos sinais, nos outdoors, nos shoppings, nos bares, nas buzinas, nas salas de jantar, nos blogs, nas estantes empoeiradas e tudo o que alude um universo urbano em transformação. O espaço vazio surge quando há opções demais, autonomia demais, liberdade demais, ética de menos.

Perplexidade de menos.

O espaço vazio é um zero perplexo.

Não há mais surpresas, porque de tudo já se experimentou, já se viu; tudo já se esgotou e o homem sabe que o limite agora são seus valores – que estão cegos e caducos. O que tenta o homem? Ele segue a linha vaga que separa o pensamento da ação e testa a vulnerabilidade do nada absoluto.

Há somente grades de ferro transpostas pelas palavras.

sexta-feira, 30 de maio de 2008

O guardador de instantes


(Gravura de Franz Krajcberg - acervo do MAM/SP)

Eu entro pra trupe de Caeiro
Não penso nada não faço nada
Não sou ninguém.

Eu quero uma casa no campo
Quero Marília nua na janela
Sentar na cadeira vazia
Não ser ninguém.

Eu passo leve como o vento
Eu visto a camisola eu bebo água
Deixo os pés descalços os filhos descalços
Descalço os medos os modos
As mães as coisas. Eu boto o pé na lama
Eu jogo truco eu varo a noite
Faço uma seresta um desenho uma careta
Amor escândalo e silêncio.

Eu não sou ninguém.

Infarto

Da válvula tricúspide
Restaram apenas
Alguns perdigotos.

terça-feira, 27 de maio de 2008

Ou lipo, ou Lupo



Na fila do caixa na Renner, o marido que acompanha sua mulher pega um pacote da gôndola mais próxima e comenta:

- Puxa, olha só essa meia-calça: diz que afina a cintura, encolhe a barriga, levanta o bumbum e reduz o culote...

- Hum.

Ele olha pra ela, pensa um pouco e pergunta:

- Tem certeza de que não quer levar pra ti?

sábado, 24 de maio de 2008

...

Taquepariu.
A geminiana aqui JÁ cansou da cara do blog. Não adianta, acho que é a síndrome da casa nova: tem que inventar moda, botar uma cortina de crochê, pintar um quadro pra pôr na sala, trocar o piso, arrastar o móvel mais pra lá. O problema é COMO fazer isso no leiaute do blog. Ah, mas eu descubro.
Aguardem novidades - mas só depois de entregar o segundo capítulo da dissertação, porque o bicho tá pegando.

Porcaria

(arte de Isabel de Castro - acervo do MARGS)

Quatro paredes, sete chaves, na cabeça nada.
Palavras em versos tortos
Conduzem o que se traduz
Por carne de pensamento.

Sem um final bonito
Ou uma luz mais forte,
A carne vira um bife malpassado
Daqueles com gosto de bicho morto
E enche a cabeça de porcaria.

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Por um fio

(Arte de Pollock)

Traço as linhas em curva do carretel
Tenciono o nó
Nó por nó que desfaz o brio
Gato que enrola
Fio em fio.
Padeço por entre os dedos
Da paciência que ronrona aos meus pés.

terça-feira, 20 de maio de 2008

Alemão?




Uma vez resolvi que iria aprender alemão.

Sozinha.

Alemão?? - diziam alguns. Sim, acordei um dia, tomei uma benzetacil de ânimo e vam’lá! Me agarrei com as duas mãos naquele dito: “não sabendo que era impossível, ele foi lá e fez”. A função durou muito pouco tempo, apesar de a Internet disponibilizar um belo material para autodidatas. Durou pouco porque o princípio que estava alavancando minha atitude e me enchendo de coragem fora fatalmente alterado:

“não sabendo que era impossível, ela foi lá e viu que era praticamente inviável!”

Talvez não pelo alemão em si, falado por Nietzsche e todo mundo, mas pela dificuldade do começo. E como é difícil começar o que quer que seja! Esse texto, inclusive, me veio à cabeça o mote enquanto recolhia as roupas do varal e tive de largar tudo para não perder o começo.

Meu mundo por um bom começo.

Depois disso, vai que vai! Começar uma receita nova de bolo (ai, meus bolos abatumados), uma blusa de tricô, minha dissertação do mestrado, um trabalho novo, um dia novo... voltar das férias, aprender a dirigir, dar uma má notícia, entrar na fila do tobogã...

(Logo vi que alemão é fichinha!)

segunda-feira, 19 de maio de 2008

O velho caderninho

Bom é criar em palavras dentro do caderninho. O santo caderno anônimo de todo dia, que dá a segurança de brincar de casinha e segredar a loucura. É andar de bicicleta sozinho por uma extensa via sem carros e bem iluminada.
Mostrar essas palavras, porém, é o primo mais velho que espia a brincadeira; é conduzir a bicicleta sem as mãos, equilibrando as palavras em um suspiro.

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Depois de me reencontrar com meus diários e meus antigos cadernos de poesias - velhos, amarelados e imaturos -, decidi recuperar o lado lúdico da coisa, me artistar de novo, voltar a escrever coisas do coração (que brega isso), ouvir mais música, quem sabe voltar a tocar e a desenhar, pintar e bordar. Difícil. Trop difficile com tanto projeto de gente grande. Mas não adianta. Tem uma creche inteira dentro de mim, suplicando pelo recreio.

Voilà.