segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Cinismo calviniano



Sou uma fã inveterada do Calvin, e hoje minha amiga Pati Pilla postou no Facebook um link pra uma frase dele. Dificilmente sigo esses links, pois tenho uma certa preguiça com referências de redes sociais; mas como era Calvin - e como era a Pati -, fui conferir. E encontrei um verdadeiro e delicioso tesouro virtual: Frases do Calvin. Abaixo, seguem algumas das pérolas extraídas do blog:


"O problema das pessoas é que elas são apenas humanas".

"Eu só perdi um jogo idiota, mas meu espírito permanece invencível".

"Nunca consigo fazer todo o 'Nada' que quero". (É o que sempre penso quando terminam as férias).

"Quando você pensa como uma torradeira trabalha 'bem' queimando seu pão, fica difícil acreditar que alguém ainda pegue avião". (Bem alentador ler isso três dias antes de embarcar num...)

"Se não ganhar um beijo de boa-noite, eu acabo tendo sonhos kafkianos". (Imaginação com doçura).

"Eu sei que a vida é uma jornada, mas eu estou cansado de perder tempo no trânsito". (Da burocracia da vida).

"Para estragar o prazer de uma brincadeira, nada como descobrir que foi educativo". (Reflexão assaz importante pra uma professora preocupada em tornar suas aulas sempre mais interessantes).

"É muito mais divertido culpar as coisas em vez de arrumá-las".

"Na minha opinião, nós não desenvolvemos pesquisas científicas suficientes para encontrar a cura para os idiotas".

"Faça o que tem que fazer e deixe os outros discutirem se é certo ou não". (Artistas versus críticos?)

"Matemática não é uma ciência, mas uma religião, pois os números se transformam como num milagre e você simplesmente tem que aceitar". (Haha, sempre tive essa impressão na época do colégio).

quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

Caixa de surpresas


Por muito tempo
Pandora escondeu
De si mesma
O segredo da humanidade.

Numa noite de primavera
Saiu do seu ninho
Tomou sem rumo uma estrada qualquer
Bebeu vinho
Dançou com um pajé
Pés plantados na terra.

E quando na sua embriaguez acreditara
Que já não havia mais
O que descobrir,
Encontrou uma pequena gruta
Incrustada no solo onde dançara horas antes.

E nessa gruta
Encontrou a semente
De todos os males do mundo.

sábado, 15 de janeiro de 2011

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

"A dor é inevitável. Sofrer é opcional" (Haruki Murakami)

Haruki Murakami

Muitas vezes a gente tende a ignorar alguns singelos sinais que aparecem ao longo da vida. Coincidência ou não, eles surgem em diferentes dimensões, em diferentes esferas - mas nos momentos exatos.

Tendo acabado a leitura de O grande Gatsby, recebi de um amigo querido a indicação do livro Do que eu falo quando eu falo em corrida, de Haruki Murakami (ed. Alfaguara). Comecei a leitura por gostar muito de correr, mas confesso que não coloquei muita expectativa, pois andava mais no clima de ler literatura. Fui surpreendida então por dois fatores: o primeiro é que Murakami é um romancista japonês de prestígio, lido no mundo todo (adoro essas descobertas). E o segundo é que ele traduziu - justamente - O grande Gatsby para o japonês.

O livro então resulta num registro pra lá de sensível e filosófico sobre as inúmeras relações que há entre correr e escrever ficção. Contando como se tornou um corredor e um escritor, o autor reflete sobre motivação, sobre o processo de pensamento de quando se corre e quando se escreve, sobre limites... Mas sobretudo trata da arte de ficar sozinho e da sua relação com o tempo - seja o tempo dos treinos, das provas, seja o tempo da sua própria existência. E falando em existência, Murakami nos ensina a contemplar tanto o que está ao alcance dos olhos - como quando descreve o que observa ao longo das corridas - como o que não é possível ver, mas sentir: o nosso quinhão humano, a nossa parte dentro de um ciclo, os nossos próprios ciclos, a noção que adquirimos da nossa própria fluidez. Nesse sentido, o autor nos revela que os atos de correr e de escrever romances portam duas forças antagônicas e complementares: assim como o corredor pode por vezes desfrutar de uma sensação de poder - e o cruzamento de uma linha de chegada pode traduzir isso -, o escritor pode por vezes brincar de deus, uma vez que o domínio da palavra e da narrativa lhe permite criar quantos mundos desejar. Mas o outro lado também mostra que, assim como o corredor pode por vezes se sentir falível, sabendo que não tem pleno controle sobre o corpo e sabendo que esse corpo perece, o escritor lida com a matéria humana, ambivalente e conflituosa, logo, imperfeita.

E é cultivando com muita concentração e perseverança essas duas práticas - uma que mantém o corpo são e a outra que assim mantém a mente - que Haruki Murakami também nos mostra que, dentro da lógica do tempo, há uma construção muito bonita da noção de individualidade, dado que, para desenvolvê-las com competência, é preciso gostar de estar sozinho. Estando sozinho é possível ouvir os próprios pensamentos, entender o tempo e consequentemente amadurecer, transformando a própria realidade. E uma dessas transformações incríveis pela qual passou nosso autor foi abrir mão do hábito de fumar 60 cigarros por dia.

Desse livro, ficou para mim uma série de reflexões, mas, de acordo com a leitura que fiz, existe uma que poderia resumir a obra: correr e escrever é sobretudo lidar com o invisível: com os tempos, com a paciência, com os processos, com os resultados inesperados, com o deleite e com a dor.

***

Abaixo seguem alguns trechos para degustação:

"Acho que a coisa mais afortunada de todas foi que nasci com um corpo forte e saudável." (p. 39)


"Tenho apenas alguns motivos para continuar a correr, e um caminhão deles para desistir. Tudo que tenho a fazer é manter esses poucos motivos muito bem-cuidados." (p. 66)

"No meio desse fluir, tenho consciência de mim mesmo como uma minúscula peça no gigantesco mosaico da natureza. Sou apenas um fenômeno natural substituível, como a água do rio que corre sob a ponte na direção do mar" (p. 81)

"Quando paramos para escrever um romance, quando usamos a escrita para criar uma história, queiramos ou não, um tipo de toxina que jaz nas profundezas de toda a humanidade sobe à superfície" (p. 85)

"Correr adentrara o território da metafísica. Primeiro vinha a ação de correr, e acompanhando-a estava essa entidade conhecida como eu. Corro, logo existo." (p. 99)

"Olho para o céu, perguntando-me se dá para entrever alguma bondade ali, mas não. Tudo que vejo são as indiferentes nuvens de verão vagando através do Pacífico. E elas não têm nada a me dizer. Nuvens são sempre taciturnas. Provavelmente, eu não deveria estar olhando para elas. Deveria era estar olhando dentro de mim. Como que fitando um poço fundo. Posso ver bondade ali dentro? Não, tudo que vejo é minha própria natureza." (p. 128)

"Um dos privilégios concedidos àqueles que evitaram morrer jovens é o direito abençoado de ficarem velhos." (p. 105)

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

R$30,00 valem a madrugada?




Quinta-feira, 23:55, diálogo entre casal que se sucede dentro do carro:

Ele: Como assim, "estraguei teu liquidificador"?

Ela: Sim, benzinho, depois que tu colocaste superbonder, o troço só funciona se a gente fica com a mão em cima!

Ele: Ah, injusto isso! A batida de banana que eu fiz depois do conserto ficou ótima.

Ela: Mas fez um barulhão...

...

...

Ele: Nossa! Olha o tamanho da fila pro torra-torra de amanhã do Magazine Luísa! Eles vão passar a noite toda aqui só pra comprar eletrodoméstico?!...

...

Ela: Mas bem que tu tá me devendo um liquidificador!

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

O grande Gatsby, de F.S. Fitzgerald

Scott Fitzgerald

Tenho um preconceito bobo que obviamente não se sustenta: sempre que vou ler alguma obra norte-americana, torço o nariz. Me cheira a pedantismo, a invenção de moda, a sectarismo, enfim. Mas o engraçado é que, do pouco que já li da literatura yankee, gostei de tudo, he. Bukowski, John Fante, Allen Ginsberg, Hemingway, Salinger... e acredito que ainda me falta ler Truman Capote, John dos Passos, entre tantos outros.

E com F. Scott Fitzgerald foi o mesmo ranço, que ironicamente durou até a primeira linha de “O grande Gatsby”, que dizia: “Em meus anos mais juvenis e vulneráveis, meu pai me deu um conselho que jamais esqueci: ‘Sempre que você tiver vontade de criticar alguém, lembre-se de que criatura alguma nesse mundo teve as vantagens de que você desfrutou’”. Me chamou pra leitura, então. E o livro, narrado pela personagem Nick Carraway, vai falar do american dream vivido pela juventude dos anos 20, pós-Primeira Guerra. Em época de lei seca, a sede de viver dos jovens abastados era saciada pela atmosfera de jazz, coupés e festas privadas regadas sim a uísque, champanha e vestidos de soirée.

Pela voz de Carraway, Fitzgerald desconstrói então a imagem desse sonho americano. Ou melhor, aproxima-se dessa grande tela pintada com aparente perfeição para observar o traço do pincel, a impureza da tinta e das combinações de cores. Assim, revela para o leitor que aquilo que é muito idealizado não se sustenta, pois há gente de carne e osso que sonha. Gente falível, vulnerável, gente solitária, gente agressiva, sensitiva, dominadora e ao mesmo tempo frágil. E um castelo feito dessa areia acaba sempre cedendo.

Mas sempre houve, na literatura universal, histórias de castelos de areia, de aparências difíceis de serem mantidas dado a natureza humana das personagens. E nesse sentido, acredito que há dois aspectos fundamentais que tornam “O grande Gatsby” um clássico: o primeiro é o quadro que se faz de uma época e de um local, um zeitgeist – e a descrição dos bailes na mansão de Jay Gatsby não pode ilustrar melhor. O segundo, que pra mim é o mais genial de todos por ser complexo, são as relações aparentemente frívolas e passageiras que, quando entendidas, adquirem uma tensão constante, uma corda esticada, que se rompe não só com uma tragédia, mas com a tragédia das constatações do que, afinal, realmente constitui os jovens que vivem esse sonho americano.

Nesse sentido, haveria muito do que se falar de cada personagem, mas acho que por agora está bom. Pra encerrar, seguem abaixo dois trechos da obra (ambos do capítulo VI) que pra mim representam essa fragilidade humana, o desejo – e o medo – ocultos de que algo verdadeiro venha a acontecer, e a incapacidade de comunicar o que há de profundo e genuíno. Deve-se dar um desconto à tradução, que é sofrível (edição da coleção da Folha de São Paulo).

“Seu olhar desviou-se de mim e buscou o topo da escadaria iluminada, por onde os sons de Three o’clock in the morning, uma pequena valsa triste, delicada, daquele ano, saíam, flutuantes, pela porta aberta. Afinal de contas, na própria casualidade da festa de Gatsby existiam possibilidades românticas inteiramente ausentes de seu mundo. Que é que havia naquela canção, que parecia chamá-la de volta à casa de Gatsby? Que aconteceria agora, naquelas horas vagas, incalculáveis? Talvez chegasse algum conviva inacreditável, alguma pessoa rara, diante da qual as pessoas ficassem maravilhadas, alguma jovem autenticamente radiosa, que, com um simples olhar a Gatsby, um momento de encontro mágico, apagaria aqueles cinco anos de perseverante devoção”.

“Em meio de tudo o que ele disse – e até mesmo em meio de sua espantosa sentimentalidade –, eu recordava algo... um ritmo fugitivo, um fragmento de palavras perdidas, que eu ouvira, havia muito, algures. Por um momento, uma frase procurou formar-se em minha boca, e meus lábios se entreabriram como os de um mudo, como se houvesse neles maior esforço do que poderia produzir um súbito sopro de ar. Mas não produziram som algum – e aquilo de que quase me lembrei permaneceu para sempre incomunicável”.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Asas às iluminuras


Cornelius Escher. Sempre meu preferido, não adianta.

Há uma peculiaridade na minha vida pessoal que me frustra um pouco, talvez por dizer respeito, de certa forma, à minha escolha profissional: minha memória para as leituras de lazer.

Tenho o hábito de ler com um lápis na mão, fazendo marcações, tomando notas nas margens das páginas, deixando pedras pelo caminho, de modo que o livro em questão passa a adquirir ares de edições medievais, tamanha a quantidade de rabiscos que se põem como verdadeiras iluminuras. Mas quando quero me lembrar de algo – uma passagem mais precisa, uma imagem, uma citação – é preciso sempre que eu volte ao livro e comece a catar a parte que me interessa, o milho bom, a agulha no palheiro. E é preciso, para isso, bastante paciência. E quando a necessidade da pesquisa resume-se à satisfação momentânea de resolver uma dúvida surgida num bate-papo qualquer, a própria ideia dessa busca adquire uma dimensão hercúlea que me afasta do livro. E me frustra.

Após terminar a primeira leitura do ano de 2011, “O grande Gatsby”, de Scott Fitzgerald (viva as férias), fui à Internet atrás de informações acerca da obra, que realmente é um achado. Mas o que acabei achando, também, foi um blog que traz uma ideia que eu sempre quis por em prática, e no entanto sempre me faltou... iniciativa: escrever sobre cada livro lido. Alguma coisa. Minhas impressões, minhas sensações, enfim, resenhas que possam ir um pouco além do gênero.

Entre tantas outras, acabo de agregar essa às minhas resoluções de ano novo, e desejo, nesse presente, mantê-la. De início, escreveria apenas pra mim mesma, para manter registros que refresquem de imediato minha memória cada vez que fosse preciso; mas pensei também: “por que não compartilhá-los?” Não que eu transforme a ideia do meu blog nisso, mas que ele seja um espaço pra esse tipo de texto também.

Vou começar, portanto, por “O grande Gatsby”, obra grandiosa. Para quem tiver saco de acompanhar, aguardem.